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Entre as gárgulas, Quasímodo e Emmanuel na deslumbrante Notre-Dame de Paris (ou o post que eu não queria editar)

Escrevi o post original no dia 12 de abril pensando em publicá-lo somente no final do mês de maio, depois da série de posts sobre Gent que ainda serão publicadas. No dia seguinte, 13 de abril, mostrei a Catedral Notre-Dame de Paris para meu filho mais velho pelo Google Maps. Enquanto exaltava sua beleza, prometi a ele que um dia levaria ele e seus irmãos para conhecerem as “minhas amigas” gárgulas de perto. Dois dias depois a histórica Notre-Dame é embebida pelas chamas cruéis de um incêndio.

Foi impossível conter as lágrimas enquanto assistia pela televisão a bela senhora queimar. Busquei noticiários do mundo inteiro para tentar compreender o que estava acontecendo. Era simplesmente inacreditável que aquilo estava acontecendo de fato.

Mesmo assim, ainda bela e nobre.

No post original, escrevi que a Notre-Dame “segue imponente, indiferente a tantos acontecimentos históricos, revoltas e guerras que por ela passaram”. Era portanto, inconcebível que ela fosse ceder ao incêndio. Assistir a torre desabar foi surreal. Realmente não podia ser verdade que 850 anos de história, arte e centro espiritual pudessem desabar daquela forma.

Me uni em coração e prece a todos católicos, franceses, historiadores, amantes da arte e de Paris naquelas 12 horas trágicas. Me lembrei de cada momento que passei quando a visitei. Quando fui barrada para assistir a missa pois acharam que eu iria tirar fotos na parte dedicada ao rito religioso, ao que respondi “sou católica e vou assistir a missa!” Os seguranças abriram passagem imediatamente. Quando tentei repetidas vezes tirar uma foto boa da Pietá. Mas todas minhas tentativas foram inúteis. Em nenhuma das vezes que a visitei eu tinha a máquina que tenho hoje. E quando subi os degraus desgastados pelo tempo para ver de perto as gárgulas que tanto admirava.

Lua de Mel, terceira visita à Notre-Dame

Uma coisa era certa, França não seria a mesma sem a Notre-Dame e Paris não seria a mesma sem as gárgulas a observando dia e noite através de tantos anos.

À noite, assisti o discurso do presidente Emmanuel Macron e suas palavras foram inspiradoras. Mais ainda, a bravura, coragem e profissionalismo dos bombeiros que conseguiram finalmente dominar o fogo e salvar a catedral. Como eu queria que isso tivesse ocorrido com nosso inesquecível museu do Rio de Janeiro, cujo incêndio também me fez chorar, e mais ainda, me revoltar com o descaso pela nossa história e arte.

Pensei em nem publicar esse post, pois ele já não corresponde mais à realidade que temos hoje, infelizmente. Mas em respeito à Notre-Dame, e principalmente, à emoção que senti ao subir em sua torre, decidi por publica-lo, e ainda antes da data prevista.

As palavras do Macron foram inspiradoras como eu disse, mas vou terminar esse texto, com as palavras de alguém muito mais inspirador para mim, alguém que me ilumina dia e noite, e por isso que eu o chamo sempre de Sol da Minha Vida, meu filho mais velho. No dia seguinte ao incêndio, ao me ver abatida, ele me falou “Calma mamãe, se eles souberam fazer tanta arte antigamente, eles saberão fazer agora também. Logo logo a igreja estará de pé novamente e você poderá cumprir sua promessa de me levar para conhecer as gárgulas”.

Aguardamos ansiosos por esse momento!

Segue o post original, escrito apenas 3 dias antes do incêndio. E que venha a reconstrução!

Entre as gárgulas, Quasímodo e Emmanuel na deslumbrante Notre-Dame de Paris

Já visitei igrejas, catedrais, mesquitas e templos mundo afora. Todos lindos, cada um a seu jeito. Mas difícil algum deles se comparar com o efeito que a visão dessa emblemática catedral nos causa. Seja sua imponência, seja sua fama, seja sua história, seja sua arquitetura, ou tudo isso junto, a Cathédrale Notre-Dame de Paris pausa nossa respiração quando a observamos por fora, tira nosso fôlego quando entramos nela e acaba com o pouquinho que restou de ar quando subimos na sua torre.

Independente da fé da pessoa, é difícil ficar imune ao impacto que essa catedral nos causa.

Maravilhoso exemplo da arquitetura medieval francesa, citada em inúmeros livros sobre arte gótica, a Notre-Dame de Paris, ou Nossa Senhora de Paris, segue imponente, indiferente a tantos acontecimentos históricos, revoltas e guerras que por ela passaram. Alguns pedaços foram danificados, é bem verdade, mas essa velha senhora permanece de pé recebendo milhares de visitantes que tumultuam seu interior e arredores. E mesmo com tanta gente curiosa querendo conhecê-la, ainda é possível assistir uma missa com muita sensação de paz interior. Eu assisti e foi uma experiência bem gratificante para mim.

O Papa Alexandre III colocou a primeira pedra em 1163, iniciando 170 anos de trabalho de milhares de arquitetos góticos e artesão medievais. A catedral foi erguida sobre um antigo templo romano e quando foi concluída em 1330, tinha 130 metros de comprimento e ostentava colunas, um grande transepto, coro e torres de 69 metros. No seu magnífico interior o rei Henrique VI da Guerra dos 100 Anos, e o imperador Napoleão Bonaparte e sua esposa Josefina foram coroados, cruzados foram abençoados e a heroína e santa francesa, Joana D’Arc, canonizada.

Mas a Notre-Dame também foi palco de violência. Os revolucionários a saquearam e aboliram a religião, transformando-a em templo da razão e depois em depósito de vinho. Na frente da Notre-Dame há 28 estátuas, cada uma com 3,5 metros, que representam os reis de Judéia. Na época da Revolução Francesa, em 1793, todas essas belas estátuas que vemos foram simplesmente decapitadas. Isso mesmo. Os revolucionários entenderam que as estátuas representavam os reis da França e tudo o que eles não queriam era menção a qualquer tipo de monarquia.

Em 1804, Napoleão restaurou a religião e daí o edifício foi restaurado, as estátuas perdidas foram recuperadas e as cabeças decapitadas reconstruídas.

Visitei a Notre-Dame três vezes e em todas as vezes ela me repetiu a mesma lição que teimei em não aprender corretamente. A importante lição de que eu precisava de uma máquina melhor se quisesse tirar fotos perfeitas de seu interior. Mesmo que em cada visita eu tivesse uma máquina diferente, não consegui tirar uma foto perfeita da Pietá no altar e outras partes da catedral. Isso por causa do seu interior muito escuro. A Pietá e o órgão saíram tremidos, mas ao menos deu para aproveitar as fotos dos belíssimos vitrais e das famosas rosáceas.

A rosácea da frente (face oeste) da catedral mostra a Virgem Maria no meio das cores dos demais vitrais.  Já rosácea sul situada no extremo sul do transepto mostra Cristo no centro cercado por virgens, santos e dos doze apóstolos. Este vitral ainda possui algumas pinturas originais do século 13. A rosácea norte também é um vitral do século 13, com 21 metros e altura, e mostra a Virgem Maria cercada de personagens do Velho Testamento.

O anteparo do altar que circunda todo ele é feito de pedra e data do século 14. Dentro da catedral ainda vemos uma estátua de Joana d’Arc, uma maquete da construção da Notre-Dame, o antigo lustre que, por causa do seu peso, agora encontra-se no chão e belíssimas pinturas. Isso porque nos séculos 17 e 18, as associações de trabalhadores de Paris doavam à catedral um quadro todo 1° de maio.

Além disso, o Tesouro da catedral, o Trésor, ainda guarda verdadeiras relíquias como manuscritos medievais e a Coroa de Espinhos e um pedaço da cruz de Cristo. A Coroa de Espinhos só pode ser vista pelos fiéis na primeira sexta-feira de cada mês às 15:00 e na Sexta-feira Santa entre 10:00 e 17:00.

Já que as fotos do interior não ficaram do jeito que eu desejava em nenhuma das minhas visitas, o jeito foi me dedicar mesmo ao que eu mais adoro na Notre-Dame, as gárgulas! Acho cada uma mais linda que a outra. Todas me chamam muito a atenção. Já gostava delas, mesmo antes de conhece-las de perto. Algo em seu aspecto estranho e digamos nada religioso, da forma como imaginamos, acaba me atraindo bastante, rs. São magníficas, cada uma a seu modo.

E tirar fotos da lista vista que se tem do alto da torre com as gárgulas se unindo a paisagem, é algo que de fato encanta e emociona. São 56 gárgulas e esculturas quiméricas construídas por Viollet-le-Duc e Bourdon, que observam Paris incessantemente. E quantas histórias elas devem ter para contar!

A cara da felicidade pela realização de um sonho

Assim como o outro solene morador da Notre-Dame, Quasímodo, o corcunda do livro que Victor Hugo escreveu com apenas 29 anos em 1831. Nessa época, o escritor queria chamar atenção para a catedral que, esquecida, estava sendo aos poucos depredada pela ação do tempo. Tenho esse livro, mas confesso que não li ainda. Acho que Victor Hugo me “traumatizou” com Les Misérables, pois choro toda vez que vejo, e o pior, independentemente da versão! E continuo assistindo mesmo assim, rs, afinal é uma obra divina que, a cada versão mostra uma faceta diferente trazendo uma mensagem a mais.

Minha gárgula favorita!

Bom, para subir na torre e visitar a moradia do Corcunda é preciso subir 387 degraus estreitos em uma escada em espiral já gasta pelos seus muitos anos. No entanto, a vista lá de cima é magnífica e faz a gente esquecer rapidinho dos degraus tortos. Na verdade, dá vontade de permanecer ali fazendo companhia para as graciosas e ao mesmo tempo medonhas gárgulas.

Na torre ainda vemos o Emannuel, o único sino original que resistiu à Revolução Francesa, já que os demais foram todos derretidos e fundidos. O resistente Emannuel só toca agora em datas especiais como Natal, Páscoa, Pentecostes, Anunciação ou em caso de falecimento do Papa. Também foi esse sino que trouxe a boa notícia do final das duas Grandes Guerras Mundiais. Fico imaginando quão especial não deve ter sido ouvir o Emannuel tocar anunciando o final de dois períodos tão turbulentos e tão tristes da História Mundial. O próprio som da libertação!

Coisas que podem ser ditas sobre o desventurado Quasímodo é que suas pernas deviam ser bem fortes para subir 387 degraus todos os dias, que seus ouvidos eram potentes para poder ouvir de perto o sino de 13 toneladas tocar, e que seus olhos se beneficiavam com a bela vista da janela de sua morada.

A fila para subir pode ser mais desanimadora que os velhos degraus em caracol, pois, além de grande, também é demorada já que sobem poucas pessoas a cada vez. Mas como já falei, mais do que vale a pena. O ingresso custa 10,00 euros, mas está incluso no Paris Pass. Para quem preferir uma fila virtual, basta baixar o aplicativo JeFile. Basta reservar o horário e aparecer na hora marcada. É possível fazer a reserva a partir de 7:30, mas sempre no mesmo dia da sua visita. A entrada para a torre está localizada fora da catedral, no lado esquerdo, na rue du Cloister Notre-Dame.

Para subir, fui fazendo algumas pausas no caminho, mas para descer, acabei indo direto. O resultado de descer os 387 degraus em espiral foi uma verdadeira prova de equilíbrio para mim. Sai andando na frente da catedral parecendo uma bêbada, pois não conseguia de forma alguma andar em linha reta no chão. Como eu ainda ria muito dessa situação, imagino a impressão que causei. Mas tudo bem, posso dizer que foi o vinho que tomei com as gárgulas. Um brinde a todas elas!

A catedral é aberta todos os dias das 8:00 às 18:45, estendendo o horário até 19:15 aos sábados e domingos. A entrada é livre, mas não é permitido portar nenhum tipo de bagagem.

As linhas do metrô 4 (Station Cité ou Saint-Michel), 1 e 11 (Station Hôtel de Ville), 10 (Station Maubert-Mutualité ou Cluny – La Sorbonne), 7, 11 e 14 (Station Châtelet) ou RER, linhas B (Station Saint-Michel – Notre-Dame) ou (Station Saint-Michel – Notre-Dame) levam até à Notre-Dame. Para quem preferir ir de ônibus, as opções são as linhas 21, 24, 27, 38, 47, 85 e 96. Paris é uma festa do transporte público!

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